domingo, junho 15, 2008

1 CASAMENTO E NENHUM FUNERAL

A primeira vez que eu tomei noção da existência da Alessandra, ela estava atrás das pernas do pai. Eu, atrás da minha mãe. A gente devia ter uns 5 anos e aparentemente já estudávamos juntos e nossos pais se conheciam de reuniões na escola. Foi um encontro casual na saída das Lojas Americanas de Campo Grande. Ela já era uma graça, morena, bochechuda, de olho verde. Mas o que entendia eu de meninas aos 5 anos?

Aos 10 anos, já na mesma turma, ela era a fim de mim. Eu, o autista (lembram????), jamais poderia me interessar por aquela menina, como por nenhuma outra. 10 anos!!! Nem me lembro se eu já tinha ereções nesta época. A única cena desse evento (ela a fim de mim) que registro na minha memória era ela de shortinho jeans MUITO curto, reclamando pra Nanda (outra amiga) porque eu não gostava dela, isso na hora do ensaio de alguma coisa (festa do folclore, talvez?). Límpido e cristalino.

Pouco tempo depois, ela começou a namorar o meu melhor amigo na época e durante muito tempo. Muito tempo de namoro dos dois, com vais-e-vens (ou seria "vão-e-vêm"?), e muito tempo que ele permaneceu meu melhor amigo. Eu não podia vislumbrá-la se casando com outra pessoa.

O tempo passa, as pessoas mudam. Alessandra continua a mesma. Por sermos os mais novos da turma (ela de 7 de agosto, eu de 19), tínhamos uma afinidade de leoninos que já sabíamos não ser possível de nos separar como amigos. Eu sempre achei que fosse vê-la a cada Natal, por mais distante que vivamos. Ela ainda acredita que esse blog aqui vai virar um livro.

Uma vez, eu a vi falar sobre o Tárique. Pra mim, era só mais um. Depois, percebi que não. Hoje, é o marido dela, neste momento. Tá eu sei, falei exatamente isso pra um cameraman (tô sendo bonzinho) na festa hoje, após ter ingerido diversas substâncias alcóolicas não-imiscíveis. Mas escrever é diferente. Escrever ainda com o jet-lag etílico das mesma substâncias, porque se um dia isto aqui realmente for publicado, como bem a Alessandra quer, o que eu penso da noite do casamento da minha melhor amiga de infância vai ser eternizado em alguma editora.

De dentro da minha alma de misantropo, não-quero-ser-pai, juro que me emocionei na igreja, 23 minutos depois de fazer uma expressão blasé pra mim mesmo e pensar que casamento é tudo igual, 12 minutos depois de mandar sms pra uma amiga dizendo que o padre falava muita merda, 8 minutos depois do microfone falhar e ninguém mais ouvir nada, 5 minutos depois de ter levantado/sentado pela terceira vez, 10 segundos depois de eu ver minha melhor amiga de infância deixar falhar a voz ao repetir as palavras pro noivo.

Ela merece ser feliz, ele acertou na loteria e talvez ainda não saiba, e eu posso continuar a achar o mundo ainda muito falso, mas talvez hoje tenha sido um pouco mais verdadeiro do que o uísque no meu copo.

Te amo, Alê. Parabéns.

segunda-feira, junho 09, 2008

INTERLÚDIO
Por incrível que pareça, ainda aguardo a Favi me devolver os guias de Buenos Aires emprestados e renovar as dicas para que eu continue a escrever o meu guia extra-oficial da cidade. Enquanto isso, eis a resenha que fiz para o site do Bacana sobre o show do B.R.M.C. lá:

Black Rebel Motorcycle Club

La Trastienda (Buenos Aires) – 04/04/2008

             As circunstâncias que envolvem a primeira visita do BRMC à América do Sul não deixam claro o porquê de o Brasil não ter sido incluído no roteiro. Inicialmente contratada como atração secundária do Quilmes Festival, que tomou o famoso Monumental de Nuñez, estádio do River Plate, por 4 dias, a banda abriu uma segunda data no clube La Trastienda, menor e, por isso, mais adequado ao clima intimista que eles gostam de criar em seus shows. Com o cancelamento da atração principal de domingo no Quilmes, Lenny Kravitz, por problemas de saúde, e a adição de duas incensadas bandas locais, Divididos e Catupecu Machu, no line-up, o BRMC viu seu status reduzido para a terceira posição, o que talvez tenha tornado o show de sexta potencialmente mais importante para os fãs e a própria banda.

          Quando surgiu na mídia em 2001, a banda de San Francisco (EUA) tinha os elementos necessários de apelo jovem pra embarcar de carona no sucesso dos Strokes: o nome tirado de gangue de cinema (O Selvagem, de 1953), o visual largado e dark e dois singles que concentravam em seus riffs a nata do rock: Red Eyes And Tears e Whatever Happened To My Rock n’ Roll. No entanto, por terem influências de bandas como The Jesus & Mary Chain, o som neopsicodélico em todo o resto do álbum de estréia acabou atraindo um público essencialmente mais velho e não tão suscetível ao hype. Os mesmos argumentos também foram utilizados pelos detratores, que preferiram enxergar nela uma falta de originalidade, o que soa injusto e desmedido nesta década que vem primando pela existência em massa de bandas derivativas.

          Desembarcando na Argentina ainda na turnê de “Baby 81”, seu mais recente e coeso álbum, em que conseguem sintetizar todas as influências dos três anteriores, tanto a lisergia do primeiro quanto o pop radiofônico do subestimado “Take Them On, On Your Own” e o lado mais-Dylan-do-que-Reid do criticamente aclamado “Howl”, o BRMC vem com fôlego renovado, com o baterista Nick Jago reintegrado à banda depois de uma temporada em clínicas de reabilitação e aptos a mostrar ao público portenho sua mistura empolgante de rock de garagem, blues, folk e gospel.

          Com o câmbio extremamente favorável ao real frente ao peso argentino (cerca de 1,80 a cotação peso/real), o ingresso de 150 pesos saiu quase de graça para um show deste calibre. A possibilidade de ver a banda de perto num clube pequeno tornou-se ainda mais palpável diante da lotação da casa, que, à primeira vista, ultrapassava pouco mais da metade de sua capacidade (700 pessoas). Este seria o meu terceiro show da banda e já tinha noção do quanto o Black Rebel tem mais força em lugares menores.

                 Com apenas 10 minutos de atraso, a banda pisou no palco. Os gritos que se seguiram e o acompanhamento em uníssono desde os primeiros acordes de Love Burns, música de abertura, já davam a crer que a platéia estava na mão. E foi exatamente com esse espírito de jogo ganho que o BRMC incendiou o La Trastienda. Em seguida, com a dançante Berlin, começaram a ditar o ritmo do que seriam as 24 músicas do setlist. O baixista e vocalista Robert Levon Been assume pela primeira vez a posição quase messiânica que repetirá à exaustão durante toda a apresentação, debruçado sobre o microfone como um legítimo crooner dos anos 50. Durante músicas mais introspectivas, como In Like The Rose e Awake, as luzes que se projetam do fundo do palco, varando a cortina de fumaça artificial e só lhe deixando a silhueta do corpo franzino e do topete, acusam uma imagem bem conhecida e dão voz aos detratores: The Jesus & Mary Chain, impossível não pensar em outra coisa. Já Peter Hayes prefere se recolher nas sombras com suas guitarras que passa o show trocando e a gaita que toca ocasionalmente, como em Shuffle Your Feet e Ain’t No Easy Way. Nick Jago... bom, Nick Jago tenta a todo custo acompanhar o ritmo acelerado que ambos impõem e o sustenta com competência todo o tempo, mesmo sendo visivelmente o único da banda sob efeito de alguma substância.

          Trocando de lugar e instrumentos, Robert e Peter executam American X, música do “Baby 81” que também dá nome ao recente EP com sobras de estúdio, em versão mais longa, como uma extensa jam session, o que também se repetiria por ainda mais tempo no show do Quilmes, dois dias depois. Na platéia, permaneço admirado ao lado de minhas duas companheiras do Brasil e observo o público misto. Há o casal de gays quarentões que têm um programa de rádio na Internet. Os namorados com figurino indie estereotipado que não conheciam a banda direito. O grupo que veio do Chile de caminhão, uma verdadeira jornada. Todos, sem exceção, maravilhados com a apresentação à sua frente, que pede a utilização dos mais variados clichês narrativos, adjetivos como “visceral” e substantivos como “catarse”. Não seria exagerado o seu uso. Tampouco seria impróprio o famoso grito de bêbado por “rock n’roooooll!!!!!”, já que é sua própria essência que vemos a banda destilar.

          Robert pega o violão e dedica Restless Sinner para os caminhoneiros chilenos e sua saga admirável. A essa altura, o show já virou uma confraternização entre amigos. Nem mesmo a repetitiva 666 Conducer consegue diminuir os ânimos. A seqüência final antes do bis, começando com Spread Your Love, fez com que Need Some Air, em seguida, refletisse o desejo do público já sem fôlego. Six-Barrel Shotgun teve versos de Leonard Cohen declamados no meio, naquela parte onde só o bumbo da bateria pede as palmas da platéia marcando o compasso. Ok, golpe sujo, mas sempre funciona. E como se questionando por que a boa música que temos a sorte de presenciar parece ter se escondido, encerram com Whatever Happened To My Rock ‘n Roll (Punk Song). Nick dirige-se à platéia com a mão apontando uma luva com um revólver desenhado, mas a brincadeira não surte efeito. As músicas nos alvejaram muito mais profundamente.

          Longos dez minutos se passam, quando a banda retorna com Took Out A Loan. Mais seis músicas, a mesma dedicação, a mesma resposta esfuziante. Lembro-me de quando eu conheci a banda, por meio de uma amiga paulistana, famosa blogueira. Ela me disse ter se deixado enamorar do BRMC pelo refrão “Eu me apaixonei pela doce sensação / Eu dei meu coração para um simples acorde / Eu dei minha alma para uma nova religião”. Pois se diga isto a cada um dos presentes no show do La Trastienda e com certeza se verá total anuência.

          A banda vive se debatendo com questões metafísicas e religiosas ao longo dos 4 álbuns, com o estado da alma e a possibilidade de salvação. Não à toa, terminam de vez o show com Salvation e Heart + Soul, após um total de 2:10h (!!!) no palco. Mais do que uma idéia fixa ou mera carolice cristã, os fãs do BRMC presentes podem compreender perfeitamente a preocupação da banda com suas almas, constatando o quanto fazem para deixar mais elevadas as nossas.


  SETLIST:

 

Love Burns

Berlin

Shuffle Your Feet

Stop

Ain't No Easy Way

Weapon Of Choice

In Like The Rose

Red Eyes And Tears

Awake

American X

Fault Line

Restless Sinner

Mercy

666 Conducer

Spread Yor Love

Need Some Air

Six Barrel Shotgun

Whatever Happened to my Rock 'n Roll (Punk Song)

 

BIS: 

Took Out A Loan

All You Do Is Talk

Rifles

Steal A Ride

Salvation

Heart + Soul

Site  Meter Clicky Web Analytics