WORDS ON A T-SHIRT
A piada do titulo eh a frase que eu vi numa camiseta no Reading, uma obvia sacanagem com o ja hypado filme das cobras a bordo. Um comeco de post com comical relief, ja que ainda estou um pouco chateado por perder o Electric Picnic e tambem por ser tao conformado. Um tanto mais chateado ainda porque o Franz Ferdinand esta tocando literalmente aqui ao lado do cybercafe, num show secreto (so divulgaram o local agora) para clientes da Vodafone e eu escrevo estas linhas enquanto ouco "Walk Away". Isso eh Europa. Obvio que apareci na porta, mas nada feito. Acabei de vender meu ingresso no Temple Bar. A visao da grana de volta no meu bolso aplacou um pouco a minha tristeza. A nocao de que ha livros comprados quando da viagem ao Coachella em abril do ano passado e ainda nao-lidos na minha estante aplacou o meu instinto consumista que poderia piorar com dinheiro inesperado na minha carteira.
Dublin parece nao querer que permanecamos no mesmo lugar por muito tempo. O japa aqui do cyber vive me olhando de cara feia quando eu passo mais de duas horas ao computador, mesmo eu tendo pago por uma franquia de dez. Todas as lojas de comida, sejam bagels, sanduiches, paninis ou as de conveniencia da Spar (rede que toma o lugar da Tesco aqui) nao te deixam comprar e comer la mesmo. Os sinais piscantes de "Take away" ou "buy a nice sandwich.. .TO GO!!!!" sao bem claros no sentido "compra essa merda e vaza, vagabundo, nao quero te ver sujando a porra do meu chao!" Pena, o que eu fiz de piquenique em parque hoje nao ta no gibi. Inclusive, mereceriam um capitulo a parte os refrigerantes bizarros mundo afora. Depois da Vanilla Coke, Mr. Brown's Soda e a maldita root beer, as coisas mais nojentas que ja bebi, hoje o bizarrometro estourou o ponteiro: PEPSI MAX CAPUCCINO!!!!! Nao to zoando, levo o rotulo pra provar. Pra variar, uma merda. Gosto de caramelo. Alguem importa o Dr. Pepper pro Brasil, por favor? Lembro-me de que assim que cheguei na Belgica, meio perdido, entrei num jornaleiro e la estava a latinha vermelha reluzindo na prateleira. Comprei com as maos tremendo essa ambrosia terrena e, estampada na lata, li a seguinte frase: "Solves all your problems!" Mas claro!!! Como nao? Dr. Pepper forever!
Meus amigos sabem bem que sou provador oficial de Mc Donald's, sempre como pelo menos uma vez la em cada pais que visito, pra ver as diferencas. Ainda sou apaixonado pelas batatas Deluxe de Paris e Madri. Na Inglaterra, ja vendem sanduiches em baguetes com peito de frango e onion rings, ou seja, Titio Ronald quer tomar o lugar da Subway e do Burger King. Tolinho. Daqui a pouco ta vendendo kebabs, falafel e shoarma.
Hoje finalmente, com a aparicao do sol, visitei meu primeiro cemiterio da viagem, em Glasnevin, onde estao enterrados os pais do James Joyce e tambem o Michael Collins. Tambem fui ao museu dos escritores. Mais sobre isso daqui a alguns dias, estou atrasado nos relatos. Vamos retornar entao aquela manha fria e chuvosa de 19/08, data em que completei 34 aninhos e empreendi uma jornada e tanto para chegar ao V2006.
A empreitada nao era pra amador. Qualquer atraso e o dia inteiro iria pro cacete. Eis o roteiro: pegar o metro para a estacao Brussels-Midi, pegar o primeiro Eurostar pra London Waterloo as 7:10 da manha, pegar outro metro de Waterloo para a estacao de Euston e de la outro trem para Wolverhampton, no interior da Inglaterra. Fazer check-in no hotel, deixar malas e voltar para a estacao de onibus no Centro para pegar o coach pro V2006. Acredita que consegui fazer tudo conforme previsto? Mesmo morrendo e suado de carregar mochilao, sem ter mapa de Staffordshire e o horario das bandas, acabei chegando no site do festival as 3 da tarde. Ok, ja estava rolando show desde meio-dia, mas eu so acabei perdendo de marcantes o The Rifles (album bem legal, "Peace and Quiet" eh minha preferida), Lily Allen (superestimada, acho meio fraca, tambem nao curtia o Fat Les, do pai dela e do Alex James e quem ja ouviu Luscious Jackson nao ve nada de mais ali) e os Dandy Warhols (ja os vi em 2002 e acho o album novo um porre). Dias depois fui ouvir o The Grates e percebi que tambem queria ter visto o show.
O frio e a chuva tambem me deixaram de baixo-astral. Pena, Murphy ja me ajudou ate demais nesse dia, mas nao adianta dar murro em ponta de faca. Quando eu me vi sozinho, em pleno aniversario, longe dos amigos e da familia, parado no ponto de onibus a esperar a conducao pro Centro da cidade, ponderando sobre a vida, idade avancada, casamento, filhos, essas coisas (tudo isso num espaco de 10 minutos), pensei em como as coisas nem sempre acontecem como a gente deseja, mesmo que tenhamos planejado e cumprido a risca o passo-a-passo. Depois conclui que eu eh que poderia ter feito tudo muito mais bem-planejado: ter acordado no horario certo pra comprar o ingresso em Chelmsford (eh pertinho de Londres e supostamente faz sempre tempo bom, como constatei em 2004), ao inves de confundir o fuso horario, ter alugado logo o hotel, mais barato, ter verificado o ultimo dia do Pukkelpop pra ver se nao era mais vantagem ficar na Belgica, ter alugado um carro, enfim... muita grana gasta a toa, mas era meu dia, nao iria reclamar. O que eh um peido pra quem ja esta cagado?
Resolvi dar uma descansada da correria na tenda Bacardi e ouvir a discotecagem dos Loose Cannons (autores da deliciosa "La La La I'm Not Listening", de que ja falei aqui). Curioso como bandas em DJ sets tentam mostrar que gostam de musica bem diferente da que tocam. Nao foi o caso deles. Nem deu pra descansar, ja que o povo pulando com a performance explosiva do duo nao dava espaco. Misturou com Live P.A.. Legal, mas estava na hora do Hard-Fi no palco principal.
A chuva ja caia gelada na multidao que se espremia quando a banda entrou, sob urros e palmas. Sim, eles sao enormes aqui. O V2006 eh o medidor perfeito de popularidade, um festival "familia", com publico menos adolescente e alternativo do que o Reading. Snow Patrol e Hard-Fi, pra eles, sao Jota Quest e Skank. Sendo que os alternativos tambem curtem. Eh bizarro ouvir no intervalo o carinha playboy ao seu lado cantando a letra inteira de "I Am The Ressurection", do Stone Roses, mas rock eh assim no Reino Unido. Eh tipo futebol pra gente. Explica muito sobre a incapacidade da maioria das bandas brasileiras de rock em fazer algo decente. Vao jogar bola e tocar pandeiro, vao!
Enfim, Richard Archer, o vocalista, nao parecia num bom dia. Sua voz estava inconfundivelmente fudida. Garganta, talvez. O que nao o impediu de levantar o astral combalido da galera molhada. "Tied Up Too Tight", "Cash Machine", "Hard To Beat", cantadas empolgadamente pelo publico em meio ao rocar (leia-se "rossar") das capas de chuva de plastico (quando todos pulavam). Mesmo quem torce o nariz pro lado dancante e pop da banda nao pode deixar de reconhecer que eles tem carisma, competencia e as musicas SAO boas. Desde as criticas sociais (o CCTV, Big Brother britanico, que da nome ao album e que proporciona o momento mais legal do telao: a tela dividida em 4 e os integrantes aparecendo nas imagens em preto e branco das camerazinhas) ate as irritacoes banais (caixa eletronico nao, ne?), tudo eh pretexto pra algum refrao pegajoso. E o auge do show veio no final, com Richard dirigindo-se a plateia e reconhecendo que o tempo estava uma merda, que todo mundo deveria estar irritado, ainda mais com Chelmsford ensolarado, pra emendar num "Foda-se!! O negocio eh viver pro seu fim-de-semana, da maneira que puder!", seguindo com a derradeira "Living For The Weekend". Foda, nao eh toda banda que consegue segurar um palco principal.
A chuva piora, eh hora de pegar um cafe pra espantar o frio e ir pro outro palco ver o James Dean Bradfield. Esperanca que ele tocasse alguma musica dos Manics, o que acabou acontecendo, com "Ocean Spray" e "No Surface All Feeling". Ironico, com as gotas insistindo em entrar na minha capa pela parte de cima. Ainda me manda uma cover de "Raindrops Keep Falling On My Head", com a alteracao de letra dizendo "wish I was in Chelmsford instead", sob vaias gerais. Claro, brincou dizendo que provavelmente estaria dizendo o mesmo no dia seguinte la. Show curto pra avaliar o trabalho solo dele, achei bem parecido com as musicas do "This Is My Truth...". Mais dificil ainda pelas condicoes nada agradaveis.
Dei um pulo no palco Union, que parecia ter o line-up mais constante da noite: so coisas boas. Hora do The Crimea. Nao conhecia a banda, mas gostei do que vi. Terei que ouvir direito em estudio pra dar a minha opiniao, mas fazem o que chamo de "pop estranho", algo no estilo do Super Furry Animals ou Flaming Lips. Como disse, nao tem show exatamente ruim por aqui. O que ha sao sons pop ou easy-listening demais, mesmo bem tocados. Como o The Beautiful South, por exemplo, que fui ver em seguida. Em que pese sua popularidade com o publico ingles em mais de uma decada, nao me segurou la por mais de duas musicas. De volta ao Union para o BellX1. Mais uma surpresa. A banda daqui da Irlanda que teve boa divulgacao com a inclusao na trilha de The O.C. na verdade tinha o nome de Juniper e era a banda de apoio do Damien Rice. Gostei mesmo, parece um Coldplay um pouco mais psicodelico, quase um Radiohead, menos intrspectivo. Assim, eu odeio essas comparacoes esdruxulas, mas categorizar som de banda eh complicado, ainda mais quando voce ve um monte de uma vez so.
A noite que comecava a cair, o calorzinho da tenda Union e a vontade diretamente proporcional de fugir do frio me fizeram decidir assistir novamente ao show das Pipettes. Ta, novidade zero, o show eh identico, as roupas tambem, perde um pouco do frescor, mas a moreninha fofa merece. Your kisses are wasted on me. E pelo menos o cinto dela nao arrebentou, como aconteceu em algum show europeu destes ultimos dias, acertando o rosto de um fa incauto. A chuva deu um descanso (ja estava tudo enlameado mesmo) e fui conferir os ultimos 15 minutos dos Charlatans. "Blackened Blue Eyes" , o bom single novo, "How High" e outra que desconheco. Sei la, aquele show do Olympia em 2002 foi bem fraquinho, perdi um pouco o tesao que tinha pela banda. Mas foi bom como musica de fundo.
De volta ao quentinho pra assistir aos canadenses do The Dears. Achava bom, nada espetacular, mas tava valendo pra nao bater queixo. Qual nao foi o meu espanto ao ver um dos melhores shows do festival inteiro e o melhor daquele dia. Amplificado pelo fato de nao ter apenas uma, mas sim DUAS tecladistas gatas (que tambem cantavam), perdoem-me a pseudo-misoginia, o vocalista/guitarrista Murray Lightburn parecia receber o espirito de algum crooner desencarnado dos clubes de musica negra do Mississipi dos anos 50, com roupagem college-emo (aquela coisa chorosa, mas que soa bela, sabe o que eu digo? Tipo um Arcade Fire nao-chato). Uma apresentacao cheia de emocao por parte da banda e presenciada com a mesma sensacao de "abra seu coracao" por parte do publico. OK, estou esgotando meus adjetivos aqui. Vou passar a utilizar abreviaturas, algo como TBES = Tocam Bem, E So ou FOSQVDN = Fudido O Show, Quero Ver De Novo.
Ainda sobrou folego pra ver o Razorlight. Ja os vi 3 vezes, todas otimas, sabia bem o que esperar. O album novo eh muito bom, pelo que ouvi, e Johnny Borrell pode ser egocentrico, mas comanda o publico do jeito que quer. E "Golden Touch" ao vivo eh fantastica. Bom, 25 minutinhos bastaram pra eu constatar que eles continuam os mesmos. Impecaveis. Uma forca sonora. Por falar em Razorlight e Sonora... Bom, abafa o caso... Vamos entao ao meu ultimo show da noite, algo que eu ja queria ter feito ha 4 anos, ver um show decente do Cooper Temple Clause. No Reading 2002, mal deu pra entrar na tenda lotada. Eles eram a unica banda local, dai o prestigio com o publico presente na epoca. Mas eh claro que este prestigio nao morreu, afinal, que outra banda que nao esta com album lancado ou nas paradas estaria fechando um palco destes num festival de renome? So os caras do CTC pra ter essa moral e um publico que ainda resiste fielmente.
Com um membro a menos (Didz esta no Dirty Pretty Things), o Cooper nao esmoece frente ao desafio e detona 45 minutos da sua explosiva mistura de guitar rock e eletronica. Bom, a parte eletronica foi prejudicada ao longo de todo o show por problemas tecnicos, mas isso nao os deteve de levar a plateia ao delirio (Gente, quantos cliches narrativos, alguem me salva!!!!) com "Been Training Dogs", "Film-maker" e "Who Needs Enemies?" (com corinho), fechando com "Panzer Attack". A nova, "Damage", eh muito boa. So faltou "Promises Promises", do segundo album.
Foi isso, saldo positivo, fiquei mais velhinho, curti o que pude, ainda deu tempo de comer um doner kebab ao chegar no centro de Wolverhampton e, finalmente, dormir numa cama decente de hotel. Melhor ainda, depois de assistir a varias musicas dos shows de Chelmsford pela TV, no Channel 4, com Zane Lowe e Jo Whiley apresentando. Sweeeet!!!!!!
Ate amanha. Cansei, porra.